sábado, 20 de setembro de 2008

E SE EU NÃO FOSSE PROFESSORA?

Eloiza Marinho


Às vezes, pego-me a pensar:
“E se eu não fosse professora...
o que teria a ganhar?”

Possivelmente não teria visto aquele sorriso brejeiro
da criança aprendendo as primeiras letrinhas
e criando mil estórias, contadas e recontadas
com aquele jeitinho faceiro.

Talvez não receberia o recado amoroso
cheio de corações e beijinhos,
daquelas crianças pequenas,
que já sabem muito bem expressar suas emoções.

Não ouviria as contestações,
alternadas pelo humor irreverente,
próprios da fase adolescente.

Perderia do jovem, em seu vigor,
a sede do amanhã,
o desejo de realizar projetos
para um futuro melhor.

Não veria, satisfeita,
o adulto que vem feliz me contar
que já sabe escrever seu nome
e ler a placa do ônibus que precisa “pegar”.

Não encontraria no mundo do trabalho,
Recepcionista, advogado, frentista,
Comerciante, comerciário, doutor,
Dona de casa, bancário, agricultor,
Jornalista, desempregado,
Político ou professor...
Profissional que não tenha em si
O reflexo de um professor/a.

E, então, começo a perceber:
“E se eu não fosse mesmo professora...
O que mais poderia eu ser?”

Se eu não fosse professora...?
Ah! Voltaria correndo à sala de aula
E escolheria muito bem:
Que tal um curso que me fizesse ser
uma melhor educadora?


Imagem: bolordepao.blogspot.com/2008/03/professor-e-j...

É PRECISO NÃO PERDER...

Eloiza Marinho

Que não percamos a capacidade de sonhar com um mundo melhor, mais justo e fraterno
e, sonhando, busquemos exercer nossa profissão com dignidade, competência e ética.

Que não percamos a capacidade de indignação com as incoerências do mundo e da sociedade em que estamos inseridos
e, indignados, decidamos ser a diferença em nossa prática cotidiana.

Que não percamos o otimismo, apesar das dificuldades que o mercado nos apresenta
e que, sendo otimistas, saibamos enfrentar os desafios que a vida nos oferece.

Que jamais percamos a esperança no ser humano
e, tendo esperança, possamos cuidar do humano na natureza.

Que não percamos a alegria de viver, própria da juventude
e, sendo jovens, possamos comunicar a alegria da vida em nossas atitudes.

Que não percamos a garra, mesmo sabendo que a vida não é feita só de vitórias
e, sendo determinados, conquistemos nosso espaço pela competência e profissionalismo.

Que não percamos a humildade que faz com que saibamos “ser eternamente aprendizes”
e, sendo humildes, saibamos aprender a sabedoria dos simples
que valoriza o ser muito mais que o ter.

Que não percamos a capacidade de compreender as prioridades do nosso tempo
e, sendo seres históricos, saibamos respeitar o passado, vivendo o presente e projetando um futuro melhor para todos os seres vivos da mãe Terra.

Enfim, que não percamos a ousadia de crer na vida
e, crendo, não esqueçamos que “a vida é concebida nos sonhos e consolidada no amor!”


Imagem: nadaalem.blogger.com.br/2006_01_01_archive.html

QUANDO A DECEPÇÃO VENCEU A ESPERANÇA



Eloiza Marinho



Todo ano de eleição é a mesma coisa. Somos bombardeados por uma “chuva meteórica de políticos” (ou seriam politiqueiros?) que surgem de todos os lados. Quem são eles?

Alguns passaram os anos sem fazer a-b-s-o-l-u-t-a-m-e-n-t-e nada em prol da população. Foram anônimos no exercício da própria cidadania e agora decidem que “é hora de fazer carreira na política”.
A gente nem sabia ou nem lembrava que tais figuras circulavam pelo meio político.

Outros definem sua “ação política” pelos acalorados discursos, preferencialmente de acusação ao seu principal opositor. Resume-se na demagogia, sua “carreira política”.

Papel também comum é o daquele que, eleito, nunca comparece aonde deveria estar; seu voto nas grandes (e pequenas) questões de interesse popular é sempre nulo, branco, ausente. Ausente nas necessidades do povo, é omisso por opção, por decisão, por caráter.

Há também aquele que é conduzido por “forças ocultas”. Não é propriamente o fantasma, mas está a seu serviço. Não vou incorrer no impropério de chamá-lo de pai-de-santo, pois respeito à diversidade religiosa, resultante desse nosso Brasil tão plural. Assim, lembro os mamulengos, as marionetes conduzidas por mãos profissionais, afinadas ao exercício de conduzir as peças teatrais de bonecos, cuja platéia manifesta-se a cada tempo de eleições... e só. Interessante é que os mamulengos quase acreditam que têm vida própria, repetindo as orientações dos condutores, assumindo suas lutas, seus interesses, seus desafetos, como se fossem próprios.

Não poderia deixar de falar do já citado “fantasma”. Um dos mais conhecidos entre nós. Não trabalha, não constrói, não se envolve. Não discute porque também nunca está presente. Classificado como “sujeito” na Língua Portuguesa, obviamente seria o “Inexistente” ou, na melhor das hipóteses, “Oculto”. Apesar do seu total descompromisso, a Nação, o Estado ou o Município continuam. Agora, justiça seja feita, na hora de receber seus gordos honorários com os adicionais que a mordomia estatal lhe concede, o sujeito torna-se bastante existente, vivo e esperto/expert.

Bom mesmo é aquele que jura que está fazendo a chamada “articulação política”. Pode parecer nome novo para os menos desavisados, mas serve para classificar as velhas negociatas, prática própria dessa trupe que diz fazer política. É também o cargo do “bobo da corte”, fofoqueiro de plantão, o leva-e-traz que ganha para isso mesmo. E dinheiro público, é claro, o que é pior. Sua função é garantir a chamada “governabilidade”. Em nome da qual “vão-se os anéis... e os dedos também”.

E desse meio, tão desprezível para muitos de nós, reles cidadãos pagantes de impostos, sempre surge aquele que há de ser diferente. Fala bonito, tem um passado limpo, de preferência um trabalhador como o povo, cheio de idéias, ideologizado, convicto dos ideais democráticos, libertários, de justiça social e coisa e tal. “O diacho é que quando chega lá fica tudo igual os outros”, dizem os menos crédulos, os mais pessimistas, diríamos. O discurso de mudança é o que leva o povo cansado e, principalmente, os jovens, a novamente empolgar-se e acreditar que “dessa vez será diferente. Com esse, o futuro vai ser melhor. Chegou a nossa hora.”

O marketing brinca com o sofrimento do povo, faz arruaça com a emoção popular. Usa, abusa da confiança do povo humilde, da força que possui de nunca desistir; lutar, lutar sempre, acreditando que dias melhores virão. “Esperar contra toda esperança”. Daí decidem seus votos.

Mas os marqueteiros não estão sozinhos. Eles constroem o personagem que os “grupos político-econômicos” nacionais e até internacionais têm interesse em “vender” para o povo. E o político interesseiro cala, consente. Quer tornar-se celebridade, quer levar sua parte da “articulação política”, quer manter-se no centro da trupe, crescer... crescer... crescer... e aparecer.

Certamente nunca leram textos como “O analfabeto político” de Bertolt Brecht e, muito provavelmente, nas faculdades e escolas que, por ventura, tenham freqüentado na vida, jamais falaram de ética pessoal, na profissão... ou de política como “arte de cuidar de um povo” ou de “governar, de gerir os destinos da cidade com retidão”. Refletir, filosofar sobre essas e outras concepções, eu sei, já é querer demais. A política que conhecem bem e praticam é a política de gerir interesses pessoais e de seu grupo. É de cunho ideológico como justificação do poder, consolidando as diferenças, perpetuando a crença de que “manda quem pode...” É o poder da esperteza. Poder este, legitimado por nós, cidadãos, nas urnas, em cada eleição.

Ficamos, portanto, a mercê da esperança em cada novo pleito. Quem sabe, algo acontecerá dessa vez... Quem sabe, alguma coisa se transforme na consciência e na postura daqueles que pensam que já sabem tudo de política. Quem sabe, seus sucessores aproximem-se mais do que realmente é essencial nesta: o ser humano, o cidadão, o cuidado com o povo, a participação coletiva e ética nas decisões da vida social. Entretanto, é preciso mais que esperança... É preciso coragem para arriscar, pois nosso voto tornou-se uma questão de risco. “Nada se conhece e todos se transformam”, em se tratando dessa política.

Então, escolher com base em quais critérios?
Corrente ideológica? Partidos e partidários mudam de idéia e de ideal conforme a “direção do vento”, em cada período eleitoral!!
História política? Xiii!!! Tem cada uma que daria uma bela novela das 7:00 ou até justificaria uma “Linha Direta Especial”.
Serviços prestados!? Em prol de quem, cara pálida?!
Propostas coerentes, viáveis, consistentes... Sem nenhuma garantia de continuidade do que já existe e funciona, nem que a “articulação para a governabilidade” permita que sejam implementadas depois.
A lista vai longe e as justificativas também. Desse jeito, o que esperar?
Não esperamos que os senhores “políticos-cadidatos” façam coisas extraordinárias, inimagináveis, mas que garantam o necessário, o justo, o correto para os cidadãos, para a sociedade, de forma ética, transparente, compartilhada. Que façam Política! E aí o poder autêntico do povo, legitimará o poder do cidadão eleito.

NÃO SOMOS IGUAIS E ISSO FAZ UMA “BOA DIFERENÇA”


Eloiza Marinho

No princípio era ela, a Terra, “inerte e vazia” ... carecia de cuidado...
... E “o Espírito de Deus pairava sobre as águas”...

O criador cuidou logo de povoar a Terra, de torná-la fecunda e abundante.
Preparou-a, cuidadosamente, e entregou para que, homem e mulher, pudessem continuar o que ali começara.
Então...
O homem descobriu-se forte, a mulher fez-se frágil.
O homem fez-se senhor, a mulher tornou-se comandada.
Os povos aprenderam o sabor da dominação, da opressão, das guerras e destruição.
Experimentaram o vazio do ódio, dos preconceitos, segregação...
Geraram fome, miséria, um mundo em exclusão.
E da terra fizeram o caos!
Mas com o tempo, “elas” foram aprendendo o valor da resistência, da luta e da contradição.
E foram tecendo idéias, construindo novas opiniões.
Do paradigma masculino,
Novo paradigma se faz.
Nem supremacia feminina, tampouco a masculina.
Um caminho construído a dois, pode até ser ideal.
Um mundo mais fraterno, de cooperação e de cuidado,
Solidários e companheiros,
Nas lutas pela justiça, pela liberdade e verdade.
Homens e mulheres, crianças, jovens e idosos,
Uma só raça, um só povo, uma mesma nação.
Apesar das diferenças, de cor, gênero, religião,
Hoje, precisa que venha nascendo,
Um mundo cada vez mais justo, de irmãos.
Tornou-se o grande desafio,
De cada mulher cidadã,
Educadora, por natureza,
Por escolha ou profissão,
Cuidar desse mundo novo, com consciência e determinação.
Fazendo com que as diferenças, não se tornem desunião,
Mas transformem-se em complemento dessa grande revolução:
Sendo você quem é
E eu quem sou,
Vamos juntos fazer da Terra um ambiente acolhedor.

TEM GENTE DEMAIS, FAZENDO DE MENOS

Eloiza Marinho

O menino não aprende... Falta família.
O jovem não aprendeu... Faltou interesse.
O adulto não corresponde... Falta base.

E assim,
O professor segue seu plano.
A Escola segue seu projeto.
A Secretaria segue suas “Diretrizes”
A família... Bom, a família continua sem saber o que fazer.

E o tempo passa...


O menino torna-se jovem
Que se torna adulto e, às vezes, “vira” professor.
Outro menino, outro jovem, outro adulto
Vão se formando.
E aquele menino, agora professor,
Compreende que é fato o aluno não aprender,
Pois ele também não sabe como fazer!
É dinheiro apertado,
Turno dobrado,
É estudo no sábado...
Férias e feriado?! Essa não!

Mas é preciso algo fazer! – Diz de si pra si.
Resolve, então, procurar uma solução.
E logo vem outro menino-professor
E mais outro... e outro...
Já não está mais sozinho.
Vê que, em grupo, é possível construir um caminho novo.
Que precisa garra, determinação, consciência,
E, sobretudo, muito amor pelo que decidiu fazer:
Ser aprendiz para que outros aprendam.

E o menino e sua família?
O jovem e seus interesses?
O adulto e sua escola?
Talvez você saiba responder
Como poderá terminar essa história.
Isso só vai depender
Da caminhada que você pretende fazer...



AVALIAÇÃO: PROCESSO DE RECONSTRUÇÃO DE SABERES






Eloiza Marinho






1. Introdução

Pesadelo para uns, demonstração de poder, dominação para outros, é assim a avaliação vivenciada no cotidiano de diversas escolas brasileiras. Em geral, usada como instrumento classificatório, é empregada apenas para aprovar ou reprovar o indivíduo, fatalmente rotulando as pessoas de sábias ou néscias, segregando as “incapazes”.

A avaliação, desse modo, tem sido tratada, equivocadamente, de forma restrita pela escola e pelos educadores. Visa apenas o produto, o resultado, de preferência final, de um processo educativo, confirmado numa nota como que sentenciando o destino escolar do indivíduo e, conseqüentemente, refletindo em sua vida para além da instituição.
Assim, tem-se feito educação. De um lado ficam os alunos, objetos do “fazer pedagógico”, dos objetivos previamente determinados por alguém que, supostamente, já sabe do que precisam, do outro lado está a escola com essa grande responsabilidade de tentar fazer com que o “ensinado” seja aprendido.

A educação abordada, então, de modo tão fragmentado, traduz uma concepção limitada, pouco integrada em suas diversas dimensões. Educação, ensino, aprendizagem, metodologia, conteúdos, objetivos, competências, habilidades e, portanto, avaliação, são elementos considerados, muitas vezes, totalmente isolados dentro do todo, sendo-lhes atribuído fim em si mesmos.
Se os elementos necessários a uma aprendizagem significativa são tratados de modo tão desvinculado, não mais articulados estão os protagonistas dessa escola em construção. Professor, aluno, gestor, técnico, família, cada um ocupa papel delimitado pelo chamado sistema ou pela própria escola que, reclamando das distâncias, não consegue estabelecer nenhuma ação de forma a garantir sua integração.

A realidade é que nem entre os professores há uma prática dialógica consistente e constante, a ponto de se elaborar projetos ou ações que alcancem êxito nas principais demandas relacionadas pelos mesmos. Estudar coletivamente, refletir sobre cada componente que faz a aprendizagem, suas dificuldades e experiências positivas, elaborar suas concepções acerca de cada temática aprofundada, é imperativo para que se vá clareando e fortalecendo as idéias, de modo que se construa uma prática pedagógica, cujas intervenções sejam menos amadoras, mais conscientes e coerentes.

A avaliação, nesse contexto, é até feita para diagnosticar realidades. No entanto, o que se percebe é que o resultado encerra em si, o professor não consegue propor ações de modo a intervir naquele resultado seja satisfatório ou não. Há somente uma constatação do erro e do acerto, uma quantificação do produto, seguida do registro nos diários, boletins ou fichas para posterior divulgação ao aluno ou seu responsável.

“Dar” nota por quê? Para quê? O aluno assim sente: “ganhou nota x, na disciplina y...” O professor, no auge do seu poder, sendo benevolente “dá” uma nota boa, sendo exigente “dá uma bomba”. O aluno não se percebe alguém capaz de conquistar a nota por competência pessoal, nem imagina que pode participar do processo avaliativo como parte de sua formação, da aprendizagem. Essa é a nossa experiência real.

Desse modo, para muitos professores, senão para a maioria, avaliar tem sido um misto de obrigação, de ineficiência, injustiça, enfim há uma sensível dificuldade em vivenciar esse processo de forma tranqüila, coerente com o que se acredita fazer como educador. Parece que tudo termina com a avaliação, vista em geral como realização de provas, testes, atividades, que levam ao final das contas a atribuição de notas ou conceitos, à “sentença” de aprovado ou reprovado (retido, para alguns). Diversificam os termos, permanecem as posturas, pautadas por concepções arraigadas de avaliação como “instrumento sancionador e qualificador” (Zabala. A prática educativa. p. 195).

Para se refletir sobre avaliação, para que se apresente uma proposta coerente, para trabalharmos um modelo mais justo de avaliação, é preciso um repensar da própria prática educativa. O que, como e quando avaliar, considerando a aprendizagem como objeto do processo educativo e aluno como seu sujeito? Quais devem ser os papéis do aluno, professores, demais educadores, a escola, numa perspectiva avaliadora, dentro de uma concepção progressista de educação?

Considerando a metodologia da reconstrução do conhecimento, onde a aprendizagem é prioridade do processo educativo, a avaliação é, necessariamente, considerada como parte de um amplo processo de formação. Não é só diagnóstico, nem resultado final, mas possui várias dimensões, as quais tentaremos apresentar a seguir.

2. Avaliamos por que e para quê?

O compromisso principal da escola com a sociedade em que ela está inserida e, conseqüentemente, com aqueles que a procuram, é com a aprendizagem. Então, democratizar a escola, mais do que oferecer vagas de modo que todos possam ingressar na educação formal, é proporcionar as condições que garantam o direito de todos aprenderem. A avaliação, nesse contexto, só tem sentido se estiver a serviço da aprendizagem real, significativa, portanto atendendo a sua dimensão pedagógica que segundo Pedro Demo,

não pode ser feita de modo abrupto, agressivo, humilhante, mas no contexto
da pedagogia igualitária, para a qual professor se define como quem cuida da
aprendizagem do aluno; isto não resulta em esquivar-se da critica ou
questionamento do aluno; ao contrário, não se aprende sem errar, duvidar,
questionar, do que segue que o aluno precisa também escutar críticas, mas sempre de estilo pedagógico (DEMO. 2004 p.67).

Assim sendo, avaliar contém em si a condição de pluridimensionalidade, no sentido que, ao mesmo tempo em que o sujeito é avaliado também avalia e vice-versa. Mas também, porque todos os partícipes do processo de aprendizagem precisam desenvolver a competência de exercer o ato avaliativo, considerando os diversos elementos que interagem para que de fato aconteça aprendizagem: ambiente escolar, proposta pedagógica, metodologia, modo como se avalia, concepções adotadas para fundamentar a prática educativa, posturas do professor e aluno frente ao desafio de aprender, enfim elementos definidos no Projeto Político Pedagógico das escolas que deveriam ser construídos coletivamente, de modo que todos tivessem acesso ao mesmo e no Projeto Pedagógico Pessoal, onde cada educador deveria apresentar suas reflexões e propostas de trabalho.

Além disso, é importante também considerar aspectos como conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais, procurando assim olhar o aluno numa perspectiva globalizante, como sujeito cognitivo, mas também, social, ético, político, afetivo, humano. Sendo assim, o aluno não pode ser tratado como mero espectador, já que se trata de um processo onde o foco é ele e sua aprendizagem.

Então, se a razão de ser da avaliação é cuidar que o aluno aprenda, é também questionável o sentido da reprovação. Avalia-se para tratar do aprender, portanto avalia-se para promover. Não do modo irresponsável dos que cuidam apenas de maquiar dados estatísticos, de sair dos baixos índices de uma avaliação nacional, mas no sentido de promoção do ser humano, desenvolvendo neste a condição de cidadão participante, capaz de construir pensamento próprio, intervir na sua realidade pessoal e coletiva.

Promoção aqui significa, necessariamente, compromisso com a aprendizagem, com uma educação de qualidade; cuidado para que os alunos progridam, tendo condições de acesso aos bens culturais construídos historicamente pela humanidade, mas sobretudo que tenham garantido o direito de conquistar novos espaços, transformar a própria história e ajudar na construção da história coletiva, “fazendo porque sabe e sabendo porque faz”, portanto conscientes da importância do seu papel na construção de uma sociedade mais justa e fraterna.

Portanto, pensar em avaliação, obrigatoriamente nos remete a uma reflexão mais ampla sobre as concepções que norteiam a prática pedagógica do educador, as ações que este desenvolve no cotidiano, as relações que se estabelecem no ambiente escolar e sobre as decisões que deverão ser tomadas a partir do que foi avaliado. Tudo isso motivado pelo compromisso de “cuidar que o aluno aprenda”.

3. Avaliar para medir ou para reconstruir?

Como parte de um amplo processo que é a aprendizagem, a avaliação perpassa todos os níveis de construção desta. Não se aprende por osmose, mas é preciso consciência. Saber o que vai bem ou não, as dificuldades que o aluno encontra para realizar determinadas ações, tarefas ou atividades, ou ainda, saber os caminhos que foram usados para que ele alcançasse certos resultados, são informações importantes para o desenvolvimento da aprendizagem. E é nessa perspectiva que se precisa olhar para a avaliação.

Avaliar envolve conhecimentos cognitivos, posturas, atitudes, ações dos sujeitos que estão diretamente envolvidos com a aprendizagem. Envolve planejamento, trabalho docente e discente, por isso é tão complexo.

Então, definir uma linha teórico-metodológica a ser seguida, tanto quanto as concepções que devem permear a ação profissional do educador, são condições fundamentais para uma prática coerente, consistente, com qualidade técnica e política. Portanto, sendo parte de um amplo processo como é a educação, a avaliação não deve se constituir uma ação unilateral, já que envolve diversos sujeitos e situações. Tampouco pode reduzir-se a verificação final de um período de estudo.

Então, como tratar a avaliação?

Sendo vista numa perspectiva diagnóstica, é compreendida como investigação, pesquisa de diferentes dados de uma determinada realidade. É tratada como olhar acolhedor sobre um contexto de aprendizagem, portanto precisa ser constante, permanente. Deve ser pautada em critérios claros e conhecidos, tanto pelo avaliador quanto por aquele que é avaliado, de modo que se possa acompanhar o desenvolvimento e propor intervenções viáveis para garantir uma aprendizagem significativa.

Sendo diagnóstica, pressupõe-se que a avaliação leve a uma tomada de decisão, pois não basta olhar para a realidade, constatar avanços e/ou dificuldades de aprendizagem do aluno, inadequação de metodologia por parte do professor, entre outros elementos que possam ser identificados ao avaliar, se isto não gerar uma reação no professor enquanto mediador do conhecimento, cuja função precípua é, segundo Demo, “cuidar para que o aluno aprenda”; no aluno, protagonista do processo educativo; na escola, ambiente responsável por produzir conhecimento, promover aprendizagem.

Quanto à perspectiva emancipatória, propõe-se que o ato de avaliar suprima a função castradora de tantos séculos que fez da avaliação mais um instrumento de poder, de coerção, de dominação, mas que assuma a condição de colaboradora na formação do cidadão autônomo, construtor de historia própria, consciente do seu papel no cotidiano coletivo, sujeito participante na sociedade em que está inserido.

Nesse sentido, destaca-se também o caráter dialógico que deve pautar uma postura democrática de educação. Ser avaliado e avaliar, propor intervenções mais adequadas frente às dificuldades apresentadas, ter acesso aos instrumentos avaliativos com seus respectivos objetivos e critérios, espaço garantido para discutir sobre notas (quando houver) e que sempre venham com um parecer, de modo que se acompanhe a evolução da aprendizagem pessoal e que se tenha a oportunidade de, questionando – nota e/ou parecer – se assim achar necessário, possa reelaborar a partir das orientações recebidas, são posturas necessárias a quem se propõe educar na perspectiva da reconstrução do conhecimento.

A avaliação, então, deve provocar o olhar atento e amoroso do educador para uma reorientação da sua prática pedagógica, alicerçada em concepções claras de educação, escola, aluno, professor, aprendizagem, homem/mulher, sociedade, que se quer ajudar a construir. Daí a importância de que esse profissional mantenha-se em permanente formação, de modo que sua ação como educador tenha a marca da profissionalidade, no que concerne ao conjunto de competências técnica, política, alicerçada em princípios e valores éticos que tornam sua prática intencional, menos amadora, mais comprometida, consciente e crítica.

4. Como avaliamos?

Freqüentemente nos deparamos com concepções reducionistas de avaliação, sendo esta confundida com alguns instrumentos normalmente utilizados para avaliar. Daí vem a “semana de avaliação”, quando são feitas provas e/ou testes que, quando muito, servem para verificar se o aluno memorizou certos conteúdos trabalhados ao longo de um período ou bimestre letivo.

Outros educadores, desejosos de superar as limitações das provas e testes que avaliam momentaneamente e apenas alguns aspectos da aprendizagem, adotam alguns critérios, os quais denominam aspectos qualitativos, referindo-se a atitudes como participação, assiduidade, “comportamento”, pontualidade, interesse, entre outras.

Tanto os chamados aspectos quantitativos, representados pelos instrumentos escritos (provas, testes, textos, trabalhos em grupo e individuais) quanto os qualitativos que correspondem às posturas, valores, disciplina, são mensurados, atribuídas notas e calculadas as médias correspondentes a um determinado período do ano escolar.

O aluno, nesses casos, é tratado de forma passiva. Recebe a nota que informa se foi aprovado ou não, se tem que “fazer a recuperação ou não”. Esta, então, é vista como uma oportunidade oferecida pela escola ou pelo professor para que o aluno tenha chance de alcançar a nota mínima aprovativa. O enfoque é dado sobre a nota, no instrumento utilizado para avaliar, não no processo construído até aquele momento.

Numa concepção de aprendizagem em que a pesquisa e elaboração estão inseridas como metodologia pautada na reconstrução do conhecimento, avaliar constitui-se parte do processo educativo. O foco aqui está sobre o aluno e sua aprendizagem. Assim, a avaliação possibilita analisar o processo, a realidade, o contexto em que se insere a aprendizagem, o caminho construído pelo aluno, mediado pelo professor a partir de fundamentação teórico-metodológica, para que se proponha intervenções adequadas para a reconstrução permanente do conhecimento.

A grande questão, portanto, não está, inicialmente, sobre quais instrumentos são mais adequados para avaliar responsavelmente, mas no cuidado com a elaboração e com os resultados alcançados com cada instrumento. É importante clareza sobre as concepções que norteiam cada ação pedagógica, a intencionalidade técnica e política do educador, o que leva o profissional a optar por uma determinada corrente e não por outra para fundamentar seu fazer, enfim, buscar a coerência entre reflexão e ação.

É de acordo com as convicções que se opta por uma prática avaliativa que leve ao exercício do saber pensar e da argumentação com fundamento, que contribui para a formação do cidadão participativo ou do sujeito passivo, que leve, enfim, à aprendizagem compreendida como capacidade de elaboração própria, de transformar informações em conhecimento e de fazer uso deste em diferentes circunstâncias da vida.

Avalia-se a rotina escolar a partir de objetivos e critérios claros, com o olhar de quem cuida, de quem tem compromisso de garantir o direito de todo cidadão aprender.

5. Conclusão

Compreendida como parte do processo educativo, a avaliação deve ser permanente. Sua razão de ser é “cuidar da aprendizagem”. Só faz sentido avaliar na perspectiva de reorientação da ação educativa, do fazer pedagógico, cujo enfoque principal deve ser o aluno e seu processo de aprendizagem.

Avaliamos para garantir que o aluno aprenda, para promover o sujeito na condição de cidadão autônomo que constrói e reconstrói pensamento próprio, capaz de intervir na história pessoal tanto quanto na coletiva. Portanto, pensar avaliação é refletir sobre educação, escola, aprendizagem, professor e aluno, sociedade, mundo; é ter clareza das concepções que permeiam a prática pedagógica assumida pelo educador; é diagnosticar uma realidade para poder intervir significativamente nela; é promover o diálogo crítico-argumentativo, de modo que avaliar não seja uma ação unilateral, mas que, superando a sua utilização como instrumento de poder e coerção, gere uma postura emancipatória nos protagonista de uma educação, cujo desafio se dá no enfoque da aprendizagem reconstrutiva política. Enfim, que avaliar seja um contínuo olhar amoroso que leve a ações que garantam para todos o direito de aprender.


Referências

DEMO, Pedro. Ser professor é cuidar que o aluno aprenda. 2 ed. Porto Alegre: Mediação, 2004.

HOFFMAN, Jussara. Avaliação Mediadora.

LIBÂNEO, José Carlos. Organização e Gestão da Escola: Teoria e Prática. Goiânia: Alternativa. 2001.

LUCKESI., Cipriano. Avaliação da aprendizagem escolar.

PERRENOUD, Philippe. Avaliação: da excelência à regulação das aprendizagens – entre duas lógicas. Porto Alegre: Artes Médicas Sul. 1999.

ZABALA, Antoni. A pratica educativa: como ensinar. Porto Alegre: ArtMed. 1998.